
Neste post iremos explicar um pouco sobre a metodologia para classificação tecnológica aplicável aos projetos de inovação, ou seja, o TRL (Technology Readiness Levels), e ainda, estabelecer a correlação desse com o ciclo de vida de um projeto de PD&I.
Nosso objetivo é facilitar a análise dos mecanismos de fomento à inovação, como incentivos fiscais e instrumentos de fomento, a partir da escala de TRL para definir critérios de avaliação e seleção de projetos, a depender de cada instrumento e das peculiaridades inerentes a cada setor.
A classificação das tecnologias ocorre por meio da avaliação dos níveis de maturidade da tecnologia, na escala de 1 a 9 do TRL. Importante notar que esse foi desenvolvido pela NASA na década de 70, especificamente para aplicação em materiais relativos aos sistemas espaciais. Agências como o Departamento de Defesa dos EUA e a Agência Espacial Europeia (ESA) adotaram, deste então, esta escala para as iniciativas de desenvolvimento tecnológicas, e em 2010 o TRL foi referenciado pela Comissão Europeia para que fosse adotado nos projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I).
Em 2013, alinhada à escala TRL, foi elaborada a norma ISO 16290:2013, pela Technical Committee Aircraft and Space Vehicles (ISO/TC 20), Subcommittee Space Systems and Operations (SC 14), conforme ISO/IEC Guide 21-1:2005. Dois anos depois, a ABNT criou a norma NBR ISO 16290:2015, sendo esta uma adoção idêntica, em conteúdo técnico, estrutura e redação, à ISO 16290:2013.
Mas qual o objetivo do TRL?
Em quais situações tem sido empregado? O principal objetivo dos níveis de maturidade tecnológica é apoiar gestores na tomada de decisões relativas aos investimentos e esforços por etapa de desenvolvimento, visando a transição dos graus de maturidade da tecnologia.
Pode-se utilizar o TRL como uma ferramenta para gerenciar o progresso da atividade de pesquisa e desenvolvimento de uma organização, seja ela um projeto, programa, produto ou processo. Através do TRL é possível definir a maturidade tecnológica de diferentes elementos. Entende-se como elemento qualquer item ou objeto analisado, pode ser um componente, uma parte do equipamento, um subsistema ou um sistema.
Quanto à classificação do TRL definiu-se que quanto mais madura está uma tecnologia, mais alto é o TRL, que vai de uma escala de 1 a 9. Assim, quando a tecnologia de um elemento atinge o nível de maturidade 9, entende-se que ela atingiu o desempenho esperado no ambiente operacional real, em um estágio de industrialização e comercialização.
Níveis de maturidade
Segundo a NBR ISO 16290:2015, os níveis de maturidade podem ser definidos conforme apresentado a seguir:
TRL 1 – Princípios básicos observados e relatados
Neste nível estamos falando de atividades de pesquisa científica, do tipo acadêmica. Possíveis aplicações da tecnologia ainda estão no estágio inicial, sem definições conceituais.
TRL 2 – Conceito e/ou aplicação da tecnologia formulados
No TRL 2 são definidos os princípios básicos estudados no TRL 1 e as aplicações conceituais são mencionadas de forma consistente, porém não necessariamente comprovada.
TRL 3 – Prova de conceito analítica e experimental de características e/ou funções críticas
O TRL 3 envolve a prova de conceito, através de modelagem, simulação e experimentação. Os estudos analíticos e laboratoriais são essenciais para a validação do conceito. Após estas atividades a tecnologia avança para o próximo nível.
TRL 4 – Verificação funcional de componente e/ou subsistema em ambiente laboratorial
No TRL 4 a tecnologia ainda se encontra na fase de prova de conceito, sendo necessário neste nível a construção de um protótipo em estágio inicial para análise da funcionalidade de todos os componentes envolvidos, porém, ainda não representa o desempenho do sistema final por estar no ambiente laboratorial.
TRL 5 – Verificação da função crítica do componente e/ou subsistema em ambiente relevante
Ao demonstrar as funções do elemento estudado em ambiente relevante, mas ainda em escala piloto, atingiu-se o TRL 5. Neste nível há uma definição preliminar dos requisitos de desempenho do elemento e o projeto preliminar, pois testes mais detalhados são realizados. Uma incerteza está relacionada à funcionalidade do elemento após o aumento de escala.
TRL 6 – Demonstração do modelo de protótipo de sistema/subsistema em ambiente relevante
A tecnologia encontra-se no TRL 6 quando o desempenho geral do modelo proposto está demonstrado. Neste estágio, a tecnologia está pronta para a realização dos testes finais, visando a aplicação final e comercialização.
TRL 7 – Demonstração do protótipo de sistema/subsistema em ambiente operacional
Neste nível são realizados ensaios com o protótipo, porém em ambiente operacional, utilizando os parâmetros reais, para análise da integração da tecnologia no sistema operacional. Neste estágio, há desenvolvimentos para a resolução de problemas de desempenho da tecnologia.
TRL 8 – Sistema real desenvolvido e aprovado
O elemento é integrado no sistema final e está pronto para operar.
TRL 9 – Sistema real desenvolvido e aprovado através de operações bem-sucedidas
O TRL 9 é alcançado quando o elemento está integrado no sistema final e operando.
Percebe-se, através dos conceitos apresentados anteriormente, que os níveis de maturidade tecnológica de um elemento não são delimitados em relação às atividades realizadas. Além disso, vale destacar que um mesmo elemento pode apresentar diferentes níveis de maturidade tecnológica, pois depende da sua aplicação e do sistema final a ser integrado.
Apesar destas definições na literatura, ISO e NASA, principalmente, ainda não existe uma clareza com aplicabilidade a todos os setores, considerando a correspondência entre os níveis de maturidade tecnológica e as fases de desenvolvimento de um projeto de inovação tecnológica. Com o intuito de esclarecer a utilização do TRL, e após estudos realizados pelos nossos especialistas, iremos apresentar o posicionamento da ABGI Brasil.
Ciclo de vida de um projeto de P&D
Considerando o ciclo de vida de um projeto de inovação tecnológica contendo as fases especificadas a seguir (atividades de P&D – pesquisa básica, pesquisa aplicada e desenvolvimento experimental – e relativos à produção), traremos um fluxo que mostra a abrangência de cada nível de maturidade tecnológica:
- Pesquisa básica: trabalho experimental ou teórico realizado principalmente para adquirir novos conhecimentos sobre os fundamentos de fenômenos e fatos observáveis, sem qualquer aplicação particular ou uso em vista (Frascati, 2015).
- Pesquisa aplicada: é uma investigação original realizada para adquirir novos conhecimentos. É, no entanto, dirigido principalmente para um objetivo específico e prático (Frascati, 2015).
- Desenvolvimento experimental: trabalho sistemático, baseado no conhecimento adquirido com pesquisa e experiência prática e produzindo conhecimento adicional, que é direcionado para a produção de novos produtos ou processos ou para melhorar produtos ou processos existentes (Frascati, 2015).
- Industrialização: caracteriza-se pelo processo de desenvolvimento industrial da solução tecnológica e está relacionado com as atividades de escalonamento, engenharia industrial e ferramentaria. Nesta fase, onde ainda está sendo avaliada a tecnologia, pode ocorrer P&D retroativo.
- Produção e Comercialização: nesta etapa a tecnologia se encontra validada, em pleno funcionamento.
Vale destacar que o desenvolvimento de um projeto não necessariamente passa por todas as fases, principalmente relacionado a fase inicial de pesquisa básica. Alguns projetos que envolvem melhorias de produtos e processos, que partem de conhecimento existente para agregação de novos conhecimentos, podem iniciar a partir da fase de desenvolvimento experimental.
Conforme definições apresentadas anteriormente para cada nível de maturidade tecnológica, faremos a correlação com as fases de desenvolvimento de um projeto.
TRL 1: em linha com o conceito de Pesquisa Básica, de estudos de novos fenômenos, novas propriedades da matéria, sem uma aplicação definida.
TRL 2: neste nível estão sendo gerados novos conhecimentos já focados em uma aplicação específica, como na Pesquisa aplicada.
TRL 3 a 6: nestes níveis há a transição da Pesquisa Aplicada para o Desenvolvimento Experimental, pois com base no conhecimento novo explorado nos TRLs anteriores, irá iniciar os trabalhos “sistemáticos” de desenvolvimento, que envolvem testes em escala laboratorial, simulações, desenvolvimento de protótipos etc.
TRL 7 e 8: nestes níveis, por haver a necessidade de escalonamento do elemento estudado em ambiente produtivo para testes e validação de seu desempenho, consideramos que ele se encontra na fase de industrialização.
TRL 9: aqui o elemento se encontra na fase de produção e comercialização, já tendo sido concluído todo o P&D expresso nas fases anteriores.
A figura a seguir demonstra nossa proposta ao correlacionar a metodologia TRL com as atividades que envolvem o desenvolvimento de um projeto de PD&I:

Este gráfico dá um direcionamento em relação ao nível de maturidade tecnológica de um determinado projeto de inovação, considerando as macroetapas do ciclo de vida de um projeto. Para atender às peculiaridades das tecnologias em setores específicos, faz-se necessário um estudo interpretativo da metodologia. E para alguns setores, adaptações são realizadas para aplicar a escala do TRL. Um exemplo está relacionado com o nível de maturidade para o processo de manufatura, denominado MRL (Manufacturing Readiness Level).
Com isso, a partir desses conceitos e correlações referente às fases de desenvolvimento de um projeto de PD&I, é possível indicar qual o nível de maturidade tecnológica um projeto se encontra e, em relação aos mecanismos de incentivos à inovação que se baseiam na escala TRL, identificar as possibilidades disponíveis para acesso às oportunidades de recursos financeiros para inovação.
Mecanismos de Incentivo à Inovação x Nível de Maturidade Tecnológica
Quando se fala em mecanismos de incentivo à inovação, estamos nos referindo aos programas que permitem o acesso a recursos financeiros públicos e privados para viabilizar projetos inovadores. Os recursos podem ser disponibilizados via incentivos fiscais por meio da redução da carga tributária, como a Lei do Bem, e também incentivos financeiros caracterizados pelos financiamentos e empréstimos realizados pelos agentes governamentais, como FINEP, BNDES, EMBRAPII.
Atualmente, há uma tendência das agências de fomento em utilizar o TRL para identificar o nível de maturidade tecnológica dos projetos de inovação inscritos em um determinado instrumento de fomento. Assim, é possível analisar qual a fase o projeto se encontra, parâmetro relevante durante a avaliação do potencial do projeto para captação de recursos. Apresentaremos a seguir a escala de TRL apoiada por algumas agências de fomento:
- A Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP: apoia todas as etapas do ciclo de desenvolvimento científico e tecnológico: pesquisa básica, pesquisa aplicada, inovações e desenvolvimento de produtos, serviços e processos, além do desenvolvimento de mercados. Sendo assim, todos os níveis de maturidade tecnológicas de um determinado projeto podem ser apoiados. Entretanto, é necessário verificar a abrangência dos níveis de maturidade para cada tipo de instrumento de fomento, já que a FINEP concede recursos reembolsáveis e não-reembolsáveis, com peculiaridades referentes a cada instrumento.
- O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES: financia projetos de longo prazo para todos os segmentos de mercado, apoiando diferentes etapas do desenvolvimento de um projeto: Pesquisa Aplicada, Desenvolvimento Experimental, Escalonamento Industrial, Estágio Pré-Operacional e Produção Pioneira. Aqui também é necessário avaliar a abrangência dos níveis de maturidade para cada instrumento de financiamento.
- A Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial – EMBRAPII: apoia projetos de PD&I com recurso não-reembolsável que se enquadram aos níveis de maturidade tecnológica de 3 a 6, conforme seu Manual de Operações. Isto por envolver as etapas de prova de conceito, validação de tecnologias em ambiente de laboratório, validação de tecnologias em ambiente relevante ou demonstração de tecnologia, modelo, sistema/subsistema em escala de produção. A EMBRAPII também faz a equivalência para as escalas de maturidade tecnológica para processos (MRL – Manufacturing Readiness Level) e para o desenvolvimento de software (STRL – Software Technology Readiness Level).
Com relação aos incentivos fiscais da Lei do Bem, podem ser beneficiadas as fases de um projeto entre 1-7, salvo exceções de atividades de P&D retroativo, que se enquadram em uma escala de TRL 8.
Por fim, embora seja possível um
correlação dos níveis de TRL às fases apoiáveis pelos instrumentos de apoio à
inovação, entendemos que a utilização do TRL como indicador para classificação
dos projetos de inovação e para fins de potencial de fomento, é um ótima
ferramenta, mas que deve ser analisada conforme a estrutura de gestão e
desenvolvimento de projetos de cada empresa e setor, uma vez que a
classificação do nível de maturidade tecnológica é ampla e possui diferentes
aplicações.