COP21
Em 12 de dezembro de 2015, na 21ª Conferência das Partes (COP21) da UNFCCC, em Paris, foi assumido o primeiro acordo universal sobre as mudanças climáticas e o aquecimento global. O Acordo de Paris, como ficou conhecido, foi assinado por 195 países, consolidando uma posição global sobre a ameaça da mudança do clima e ligando o alerta sobre a capacidade dos países de lidar com os efeitos decorrentes dessas mudanças.
O Brasil se comprometeu, em instrumento entregue às Nações Unidas em setembro de 2016, a promover uma redução das suas emissões de gases de efeito estufa em 37% abaixo dos níveis de 2005, até o ano de 2025. Além disso, indicou uma contribuição indicativa subsequente de redução de 43% abaixo dos níveis de emissão de 2005, em 2030. A fim de alcançar o objetivo o país assumiu algumas responsabilidades, dentre elas:
- (i) aumentar a participação da bioenergia sustentável na matriz energética brasileira para 18%;
- (ii) obter 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico;
- (iii) alcançar a participação de 45% de energias renováveis na matriz energética.
Matriz Energética Brasileira
A princípio vale elucidar a diferença entre matriz energética e matriz elétrica, a primeira trata do conjunto de fontes de energia disponíveis para geração de energia. Já a segunda são as fontes para a geração de energia elétrica, ou seja, a matriz elétrica compõe uma parcela da matriz energética. Superado esse ponto, segue abaixo um gráfico demonstrativo da matriz energética brasileira.
Matriz energética brasileira

A matriz energética brasileira é apontada como uma das mais renováveis do mundo industrializado, e o país com o maior mix de energia renovável. Hoje em dia cerca de 43% do consumo de energia no Brasil provém de fontes renováveis, enquanto esse número no mundo não chega a 15%. Isso se dá principalmente pela produção elétrica no Brasil ser majoritariamente através de hidrelétricas, detalhado no gráfico abaixo.
Matriz elétrica brasileira

A representatividade da geração hidrelétrica, se explica pelas condições geográficas brasileiras, com grande quantidade de rios e regimes hidrológicos variados por todo o território.
Entretanto, vivemos uma transformação significativa causada pela crise hídrica e dependência dessa fonte com o índice pluviométrico. Muito dessa crise é causada pela priorização da construção de hidrelétricas a fio d’água, que não utilizam de grandes reservatórios, ou seja, muito mais dependente da precipitação de chuva em um curto espaço de tempo. A água acumulada em grandes reservatórios possibilitava o fornecimento de energia por cerca de cinco anos, hoje este tempo gira em torno de 5 meses. A razão para esta mudança é reduzir o impacto ambiental pela inundação de grandes áreas e redução do desmatamento.
Em paralelo a isso, o Brasil seguiu novos caminhos com os investimentos em fontes limpas, como a solar e eólica. Como exemplo disso, em 2009, 84% da energia elétrica produzida no Brasil foi de origem hidrelétrica e 0,9% eólica, representando assim uma queda de 27,5% na participação da hidroeletricidade e crescimento de mais 800% de energia eólica nos dias de hoje.
Deve-se atentar a um importante detalhe, o setor elétrico além da capacidade de geração, precisa também de capacidade de armazenamento, ponto chave para a transição de uso de energias não renováveis para energias limpas, em que o armazenamento de energia de forma acessível tem transformado fontes que antes eram impraticáveis, em produto consolidado com a capacidade de serem utilizadas de acordo com a necessidade do mercado.
Contrapondo o lado sustentável da matriz energética brasileira está a geração de energia através da combustão de materiais fósseis, que hoje representa mais de 40% do total de energia produzida, representando mais de 25% de produção de energia elétrica, a partir das conhecidas termoelétricas. Esta fonte de geração surgiu como uma opção de apoio para a produção de eletricidade considerando a demanda energética do país, não apenas em horários de pico de consumo como era de prática, mas também como fontes necessárias para atender a demanda. Este fato acionou a operação de novas usinas termoelétricas movidas a óleo diesel e a gás, que apresentam dupla desvantagem em virtude do alto custo e do impacto ao meio ambiente, pela grande emissão de CO2.
Para blindar o crescimento da participação de termoelétricas na produção de energia é necessária uma visão político-econômica a longo prazo de investimentos, já antes mencionados, e outros incentivos ao desenvolvimento e à produção de energia limpa. É importante que as termoelétricas se mantenham num papel secundário, de suporte à produção elétrica, e que não se tornem a base de nossa matriz.
Veja nesse post, algumas tendências tecnológicas do setor e oportunidades de fomento à PD&I: https://abgi-brasil.com/a-inovacao-no-setor-eletrico/
Estímulos à inovação no setor energético
Hoje no Brasil são muitas as iniciativas que visam estimular as energias renováveis e a eficiência energética, como por exemplo, as leis a financiamentos especiais para este tipo de projeto. Abaixo são listados alguns destes estímulos:
- Lei de Eficiência Energética nº 10.295/2001: A lei estimula o desenvolvimento tecnológico, a preservação ambiental e a introdução de produtos mais eficientes no mercado. É ela que determina a existência de níveis mínimos de eficiência energética de máquinas e aparelhos consumidores de energia fabricados ou comercializados no país, e também para edificações construídas, com base em indicadores técnicos.
- Resolução Normativa ANEEL 482/2012: Estabelece as condições gerais para o acesso de microgeração e minigeração distribuída aos sistemas de distribuição de energia elétrica.
- Lei nº 9.991/2000: Prevê a realização de investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e em eficiência energética por parte das empresas concessionárias, permissionárias e autorizadas do setor de energia elétrica. O valor-base a ser realizado em despesas qualificadas com Pesquisa e Desenvolvimento do setor elétrico é o equivalente a 1% da Receita Operacional Líquida das geradoras e transmissoras. Desse montante 0,4% é para o FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico); 0,4% para projetos de pesquisa e desenvolvimento, segundo regulamentos estabelecidos pela ANEEL; 0,2% para o Ministério de Minas e Energia, a fim de custear os estudos e pesquisas de planejamento da expansão do sistema energético, bem como os de inventário e de viabilidade necessários ao aproveitamento dos potenciais hidrelétricos.
- Financiamento Nacional: BNDES Finem (apoio a energias renováveis e alternativas); BNDES Fundo Clima (projetos de mitigação às mudanças climáticas); Inova Energia (iniciativa destinada à coordenação conjunta das ações de fomento e financiamento por parte da FINEP, ANEEL e BNDES); FNE Sol (linha de crédito especial, disponibilizada pelo Banco do Nordeste, para o financiamento de sistemas de micro e minigeração distribuída de energia por fontes renováveis).
- Financiamentos multilaterais: BID (financiamento de projetos ambientais, com promoção do uso de energia limpa no Brasil); IFC (financiamento de projetos de eficiência energética); Basel Agency for Sustainable Energy (BASE)/IEA Technology Cooperation Program: programas apoiadores ao uso de energias renováveis.
- Programas: PROINFA (programa para aumentar a participação de fontes alternativas renováveis na produção de energia elétrica); ProGD (programa de incentivo e fomento ao desenvolvimento de geração distribuída de energias renováveis).
- Green bonds: os títulos verdes são similares aos títulos de dívida comuns, com a diferença essencial de que só podem ser usados para financiar investimentos considerados sustentáveis – como, por exemplo, infraestrutura de energia limpa e renovável, transporte verde e projetos capazes de reduzir emissões e o consumo de água, energia e matérias-primas. É uma alternativa de investimento a longo prazo que contribui para o futuro do planeta, importantes para estimular o desenvolvimento sustentável e direcionar recursos para a mitigação de mudanças climáticas.

Futuro
No assunto de produção de energia limpa o Brasil é um exemplo a ser seguido, mas novos desafios estão em um horizonte próximo, a transformação no setor energético nos próximos anos deve atingir todas as matrizes, especialmente as fontes limpas, as quais há ainda muito a se explorar no país. Porém são muitas as barreiras estruturais do país, como a falta de objetividade do plano energético para o alcance das metas do iNDC, o que existe hoje são projeções de uma possível composição da matriz energética a longo prazo.
Outro desafio é a organização transversal necessária para esse assunto e um amplo diálogo entre os agentes econômicos envolvidos, mas o país sofre com a falta de comunicação entre os principais responsáveis pela agenda de transição energética, que são o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério de Minas e Energia, e suas respectivas agências reguladoras (IBAMA, ANP e ANEEL). Além disso, o planejamento e desenvolvimento para energia elétrica de fontes mais limpas, ainda que em fase inicial, não encontra paralelo no setor de transportes.
Hoje no Brasil, mais de 60% do transporte de cargas é feito pelo sistema ferroviário que utiliza da combustão fóssil, sendo esta umas das principais fontes de geração de gases de efeito estufa no país, o que demonstra um descaso de planejamento público transversal no setor de energia. É previsto que a demanda energética cresça cerca de 3,6% ao ano até 2029, e suprir essa demanda crescente com eficiência e sem danificar o meio ambiente é o grande desafio da nossa e de outras nações. No curto prazo, é provável que o país atinja as metas estipuladas da iNDC, porém, o planejamento para transição energética é de longo prazo, e neste ponto o Brasil apresenta baixo nível de maturidade.
Por fim, é importante salientar que a matriz energética é um assunto transversal, e que varia de acordo com a singularidade de cada país, não existindo uma solução única para todas as variáveis dessa equação.
Autor:
João Tosi é graduado em Engenharia Civil pela PUC Minas e pós-graduando em BIM (Building Information Modeling) pela mesma instituição. Possui experiência em projetos de pesquisa em energia renovável e novas tecnologias na construção civil realizado na Alemanha. Na ABGI, atua em projetos de Lei do Bem e Rota 2030, sendo responsável pela análise técnica e financeira das atividades beneficiadas.