Introdução
Atualmente, a inovação já faz parte da estratégia de diversas empresas. É senso comum afirmar que se a empresa não inova, não consegue se manter no mercado. Essa frase vem seguida dos exemplos clássicos da Kodak e Blockbuster.
As empresas já sabem da importância de inovarem, e diariamente, vemos o lançamento de novos produtos e serviços. Mas não é tão comum o desenvolvimento de inovações que mudem o mercado de forma significativa. Quando pensamos em inovações mais disruptivas, normalmente vem a nossa mente: Uber, Netflix e Airbnb.
Esses são exemplos clássicos e que nos remetem ao universo das startups.
Nesse contexto, as grandes empresas têm buscado se relacionar com as startups, com o objetivo de trazer maior agilidade e a possibilidade do “novo” para o seu negócio e mercado de atuação, ou seja, a busca pelo desenvolvimento de inovações disruptivas.
Apesar de ser um tema muito debatido, ainda é necessária a compreensão de como potencializar o desenvolvimento de inovações por empresas já consolidadas no mercado.
Segundo estudo divulgado pelo jornal Valor Econômico, 72% das empresas que participaram da pesquisa Valor Inovação Brasil 2017, possuem equipes exclusivas voltadas para inovação, sendo que somente 9% não são subordinadas ao CEO. Essas equipes normalmente estão alocadas em departamentos/áreas estruturadas voltadas ao desenvolvimento de novos produtos e serviços, e são denominados de “Pesquisa e Desenvolvimento” ou “Inovação”.
Quando as atividades de inovação estão dentro de uma estrutura organizacional, essas fazem parte da priorização de alocações e recursos, sendo, portanto, suscetíveis aos cortes e mudanças conforme o cenário econômico. Nesse modelo, as áreas precisam, ainda, seguir a cultura, a governança e os processos estabelecidos para todas as áreas, não tendo então muita flexibilidade em sua governança.
Já é unânime que a inovação deve ser parte do dia a dia das organizações, mas é necessário, cada vez mais, ter pessoas focadas nessa atividade, para, dessa forma, surgirem inovações que mudem os modelos de negócios e os mercados de forma mais radical.
Nesse movimento, temos visto grandes empresas criando estruturas específicas voltadas à inovação, muitas vezes denominadas “Labs” ou “Garagem”.
Clayton Christensen, do livro Dilema da Inovação, defende que uma estrutura separada possibilita o surgimento de inovações disruptivas:
“As empresas estabelecidas que construíram com sucesso uma forte posição no mercado, em uma tecnologia de ruptura, foram aquelas que criaram, a partir da organização tradicional, outra, independente, operada de forma autônoma. (…)
Essas empresas implantaram uma organização especialmente dedicada dentro da rede de valor emergente.”
O autor apresenta como principais aspectos para a criação de uma organização independente:
- Impacto que essa inovação trará nos resultados. Caso estivesse em uma organização já consolidada, a expectativa é de que o novo produto ou serviço gerasse um impacto direto na receita, o que dificilmente ocorrerá em um primeiro momento.
- Tolerância a dificuldades e incertezas. Em estruturas já consolidadas, espera-se que os projetos priorizados já tenham os estudos de viabilidade necessários para se minimizar a chance ao fracasso.
Prossegue o autor:
“Eu posso conduzir esse desafi o de uma ou duas formas: convencendo todos na empresa principal (em suas cabeças e vísceras) de que a tecnologia de ruptura é lucrativa, ou criando uma organização pequena o bastante, com uma estrutura de custos apropriada, em que meu programa possa ser visualizado como estando no caminho decisivo para o sucesso. A última alternativa é um desafio administrativo ainda mais maleável.
Em uma organização pequena e independente, será possível criar uma atitude apropriada com relação ao fracasso. O primeiro ataque ao mercado provavelmente não será bem-sucedido. Por isso será necessário adotar uma atitude flexível diante do erro, mas é de bom alvitre errar em pequena escala, para que se possa tentar novamente sem perder a credibilidade.”
A estrutura também faz parte da estratégia
Para fomentar a inovação, a unidade independente deve ter a sua própria governança, gerenciamento e orçamento. As metas e padrões para a estrutura de inovação não devem ser as mesmas do restante da empresa. A missão dessa estrutura é a criação de algo novo que trará outras fontes de lucro, mas sem a visão de curto prazo.
A primeira etapa para compreender essa separação de estrutura é definir a sua missão. Não se trata de melhorar ou evoluir o portfólio, mas sim desenvolver algo diverso do esperado, reinventar a própria empresa.
Ao definir essa missão, percebe-se que se trata de uma definição estratégica, pois a estrutura deve gerar inovações disruptivas, isso é trazer algo inesperado para a empresa. Por essa razão, é necessário que não se siga os mesmos processos e governança das demais áreas das empresas.
A implementação de uma nova estrutura voltada à inovação é constituída de grandes etapas que incluem a definição da estratégia, a descrição do modelo operacional/fiscal, o mapeamento de recursos financeiros e incentivos fiscais e a análise do retorno do investimento. Por isso, o framework de trabalho utilizado pela Abgi no apoio de seus clientes, envolve todas as etapas para as oportunidades.
Como base em nossa experiência, percebemos que para se definir a implementação de uma estrutura independente é imprescindível que organização observe diversos elementos multidisciplinares, dos quais se destacam:
Procedimento jurídico
Tributação
Incentivos
governamentais
Transferência
tecnológica
Participação da
organização
principal
Propriedade
intelectual
Nesses aspectos, entendemos que é importante que a organização, ao definir uma estrutura independente, responda as perguntas abaixo:
- Qual o escopo e modelo de atuação?
- Quais as linhas de pesquisa existentes e quais podem ser desenvolvidas estrategicamente?
- Qual a estratégia e plano de desenvolvimento?
- Quais os principais impactos e benefícios o ambiente pode trazer?
- Como fica a propriedade intelectual?
- Quais as parcerias e
projetos potenciais e
qual o melhor modelo de relacionamento? - Qual a infraestrutura
necessária? - Quais as tecnologias
prospectadas e o que
é necessário para seu
desenvolvimento? - Qual a estrutura
organizacional necessária? - Quais os processos-chave?
- Qual a melhor estrutura
jurídica/fiscal? - Quais os possíveis recursos de fomento e subvenção que se enquadram com
a instituição e com os
projetos potenciais? - Quais os impactos para os incentivos fiscais da Lei do Bem e outros?
- Qual o investimento
estimado para a
implementação e
operação do ambiente? - Quanto desse investimento pode vir de recursos de subvenção?
- Quais os indicadores e metas de implantação do ambiente de inovação?
Diante desse contexto, a Abgi vem auxiliando as empresas na definição da melhor constituição jurídica para a estrutura de inovação, e pela sua experiência, deve-se analisar, em especial, três modelos macros que possuem impactos diretos nessas respostas:
Nova pessoa jurídica
(com fins lucrativos)
Sociedade organizada para a exploração de indústria ou comércio, que tenha na
inovação tecnológica os fundamentos de sua estratégia, com a finalidade de obter lucro por meio da produção de bens ou de serviços.
Filial
Estabelecimento dependente e subordinado a outro que é sede ou matriz.
Nova pessoa jurídica
(sem fins lucrativos)
Entidade caracterizada pelo agrupamento de pessoas para a realização e consecução de objetivos e ideais comuns, sem finalidade lucrativa, que inclua em sua missão institucional ou em seu objetivo a pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou tecnológico ou o desenvolvimento de novos produtos, serviços ou processos.
Cada um dos modelos jurídicos possuem características específicas que podem ser analisadas por meio de uma análise SWOT, por exemplo, visto que não há uma melhor constituição jurídica que seja aplicável a todas as organizações.
A partir da nossa experiência na estruturação de Ambientes de Inovação, percebemos que, além dessas serem estruturas voltadas à pesquisa e ao desenvolvimento para estimular o desenvolvimento de inovações disruptivas, é importante que as organizações também considerem como características dessas estruturas:
- cultura voltada a cultivar e testar novas ideias, separadas das demandas e pressões dos negócios;
- uma visão clara que possa evoluir ao longo do tempo;
- equipe adequada e recursos financeiros para prosseguir essa missão; e,
- suporte da líderança.
Contudo, ao decidir-se por estabelecer uma estrutura separada voltada à inovação, as organizações devem analisar qual a personalidade jurídica mais adequada para atender as suas estratégias e ter êxito no mercado.
Dentre as empresas que seguiram o caminho de estabelecer uma estrutura independente voltada a inovação, podemos citar: MasterCard (MasterCerd Labs), Vale (Instituto Tecnológico Vale) e IBM (IBM Research).
A seguir, destacaremos o case do Grupo Lego, cujo CEO, Jørgen Vig Knudstorp, defendeu a Innovation Leader, que para se inovar é necessário criar uma estrutura separada.
Caso: Grupo Lego
A história do Grupo Lego é marcada pela inovação e diversas reinvenções do próprio negócio. Ole Kirk Christiansen (criador do sistema LEGO) já trabalhava com madeira, quando em 1932 começou a produzir brinquedos de madeira. O nome Lego veio da junção das palavras “leg godt” que traduzindo do dinamarquês significa “brincar bem”.
Conforme afirma os autores David Robertson e Bill Breen, no livro Peça por peça, mesmo em seus primeiros anos, a Lego experimentou novas ideias incansavelmente, às vezes fazendo apostas altas em tecnologias ainda pouco conhecidas.
A primeira grande reinvenção veio em 1950 Quando modificaram os “Blocos de Montar de Autoencaixe”, inventado por Hilary Fisher Page em cubos plásticos com duas fileiras de quatro saliências cilíndricas, que poderiam ser empilhados e utilizados para montarem qualquer objeto.
Após diversas críticas e experimentos frustrados, a Lego, em 1958, patenteou o sistema intercambiável de montagem e encaixe dos blocos criando inúmeras possibilidades de forma.
A linha do tempo abaixo ilustra que, desde então foram diversas as inovações desenvolvidas pelo Grupo Lego:

Atualmente, o Grupo Lego tem em sua estrutura o Future Lab, uma empresa pequena e independente, que tem como foco a abertura de novos mercados, tecnologias e modelos de negócios. Com isso, espera-se que inspire o núcleo de negócios, validação de novas oportunidades de negócios e novos negócios autônomos e sustentáveis.
Foi desse ambiente que saíram alguns campeões de vendas nos últimos anos, como o Lego Friends, primeira coleção voltada ao público feminino (há uma abundância de peças cor-de-rosa e elementos como flores e plantinhas), além das linhas Ninjago e Chima, cujos personagens principais viraram tema de desenhos animados.
A história do Grupo Lego demonstra a necessidade de se reinventar e de estruturar o processo de inovação, para manter um ambiente propício ao surgimento de novas ideias e ao desenvolvimento de novos produtos.
Para conhecer toda essa história, recomendamos o livro, Peça por Peça, que nos leva para dentro do Grupo Lego, demonstrando a disciplina da empresa para estimular a criatividade e recordando uma das mais notáveis transformações empresariais da história recente.
E você? A sua empresa possui uma estrutura independente para a inovação?