
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) surgiu em 1952 como principal agente público de financiamento de longo prazo. Em sua esteira foram criados, nas décadas de 1960 e 1970, 12 bancos estaduais e um banco interestadual de desenvolvimento, que atuavam de forma complementar ao órgão federal. Ao longo das décadas, porém, boa parte dessas instituições perdeu relevância e sofreu com uso político. Atualmente, só três ainda existem: o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes), o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) e o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG).
E, no que depender do atual presidente do BDMG, Marco Aurélio Crocco, a instituição não só terá vida longa como se tornará cada vez mais fundamental às ações de desenvolvimento do Estado. Crocco tem a meta de transformar o BDMG em referência no estímulo à inovação em Minas Gerais e em agente catalisador do ecossistema de inovação mineiro.
Nesta entrevista ao Radar Inovação ele fala sobre como o Banco pretende pôr em prática esses planos, dos gargalos à inovação no Estado e do papel das startups, dos parques tecnológicos, dos agentes de subvenção e dos fundos internacionais no estímulo à C,T&I no Brasil.
De que forma o BDMG atua no apoio à inovação em Minas Gerais?
O BDMG atua com três formas de apoio à inovação: agindo como intermediário financeiro, fornecendo recursos às empresas; apoiando e aportando recursos em fundos de investimento; e por meio da BDMGTEC, que adquire participação em empreendimentos inovadores. É importante salientar que o Banco não tem um caráter de agente financiador de projetos de pesquisa com recursos a fundo perdido como a Fapemig, por exemplo. Não trabalhamos com subvenção à inovação, apesar de termos convicção de que ela é um dos elementos fundamentais de estímulo à inovação. Mas também temos a convicção de que a subvenção, sozinha, não é suficiente para colocar novos produtos e processos no mercado. Uma empresa não pode depender eternamente da subvenção. É por isso que atuamos em frentes complementares.
E quais são as perspectivas do Banco nesse atual panorama econômico de “crise”?
Momentos de crise, se por um lado criam dificuldades, por outro criam oportunidades. Estamos com a perspectiva muito clara de transformar o BDMG no banco de inovação de Minas Gerais. Queremos que, quando se falar em inovação, a associação com o Banco seja imediata. Temos como meta atender 70 projetos de P,D&I neste ano e ultrapassar os 100 em 2017. Com isso, estimamos atender praticamente toda a demanda que chega ao Banco, que ainda é muito baixa.
Qual a razão dessa baixa demanda? Como reverter este quadro?
Minas Gerais tem uma contradição em seu ecossistema de inovação. O Estado concentra 20% das instituições federais de ensino superior do país e, somadas às demais universidades e faculdades particulares, além da UEMG, são cerca de 200
locus de produção de conhecimento e formação de mão de obra. Por outro lado, observa-se a ausência de diálogo estruturado com esse substrato para que ocorra a transferência de conhecimento para o mercado. Como agente público, o BDMG lançará um produto exclusivo para apoio a startups de base tecnológica oriundas das universidades. É dessa forma e em parceria com agentes como a Fiemg e o Sebrae que podemos estimular os ambientes de negócio e implementação de políticas publicas integradas nesta área.
O apoio às startups é considerado estratégico pelo Banco? E qual sua visão sobre os Parques Tecnológicos?
Sem dúvida. As universidades são centros de excelência, e as startups são elos fundamentais no estabelecimento desse diálogo com o mercado. Os Parques Tecnológicos também são fundamentais, mas desde que seu funcionamento seja efetivo, que não sejam meras áreas disponíveis para a localização de empresas. Parque Tecnológico é diferente de Distrito Industrial. Atualmente trabalhamos, em parceria com a Fapemig, com uma linha de financiamento voltada a empresas localizadas em parques, a Proptec.
Dentro da estratégia de inovação do BDMG, quais são as áreas prioritárias a serem apoiadas em 2016? Quais as diretrizes para definição destas áreas?
O BDMG tem em sua estratégia macro o adensamento de três setores: fármacos, semicondutores e energias renováveis. Naturalmente nossas ações de inovação tendem a dialogar com esses setores, mas não elegemos áreas prioritárias, queremos trabalhar com todas as empresas inovadoras do Estado. E um dos meios para alcançarmos esse objetivo é a mudança estratégica da BDMGTEC, que foi criada com o objetivo de facilitar o aporte de capital em empresas âncora. Atualmente são duas investidas, a Unitec Semicondutores e a Biomm, única fábrica de insulina na América do Sul.
Que vantagens se apresentam a essas empresas em buscar o apoio do BDMG e não outros tipos de financiamento?
Criamos no BDMG uma cultura de análise de inovação que poucos bancos possuem. O estudo de todos os projetos de inovação que chegam ao Banco é realizado por uma equipe especializada, que tem se dedicado não só à análise, mas também ao desenvolvimento de produtos específicos de apoio à inovação.
No ano passado houve uma intensificação das chamadas de cooperação internacionais envolvendo, no Brasil, tanto o MDIC como o MCTI. Como o BDMG enxerga a importância destas chamadas para o desenvolvimento da C,T&I no país? Há oportunidades dentro do BDMG?
Existe hoje, no mundo, uma variedade de fundos específicos para inovação. O BDMG enxerga esse movimento com bons olhos, uma vez que precisamos captar recursos. Temos várias discussões em andamento com alguns desses fundos.
O marco legal de C,T&I, bem como os vetos ao mesmo, tem sido um tema bastante abordado na mídia. Como o BDMG enxerga o impacto deste marco na operação do sistema de fomento à inovação no Brasil?
O marco é importante porque legitima no Brasil vários instrumentos que já existiam em outros ecossistemas de inovação pelo mundo aos quais ainda não tínhamos acesso. Um exemplo são os fundos multinvestimentos, que são fundos com regras bem mais simples que os ritos tradicionais. A facilitação para que o setor público participe diretamente em empresas também é outro ganho. É tudo ainda muito recente, mas são amplas as possibilidades a serem exploradas. Diante desse novo contexto jurídico, o BDMG estuda oportunidades de atuação.
Alguma mensagem final aos leitores do Radar Inovação?
Destaco mais uma vez esse intuito do BDMG em se tornar referência no apoio à inovação. Esse é o verdadeiro papel de um banco de desenvolvimento, atuar onde o sistema bancário não alcança, é aí que temos que fazer a diferença. Nesse sentido, o BDMG está à disposição para conhecer e apoiar iniciativas inovadoras e para construir parcerias com o objetivo de consolidar a economia do conhecimento em Minas Gerais.
Sobre Marco Crocco
Economista pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestre em Economia Industrial e da Tecnologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e PhD em economia pela Universidade de Londres, Marco Aurélio Crocco possui pós-doutoramento pela Universidade de Cambridge (Inglaterra) e Universidade Paris-Dauphine (França).
Professor titular do Departamento de Ciências Econômicas da UFMG e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Crocco é especialista em economia monetária e desenvolvimento regional. Publicou inúmeros artigos científicos, editou quatro livros e publicou 32 capítulos de livros.
Entre 2010 e 2014 foi Diretor Presidente da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (FUNDEP) da UFMG. Durante sua gestão, estruturou o programa de apoio às spin-offs da Universidade por meio da criação da FUNDEP Participações S.A. (FUNDEPAR) – que aporta recursos em empresas nascentes de base tecnológica.