
A Medida Provisória (MP) nº 694, de 30 de setembro de 2015, em seu art. 3º, instituiu a suspensão dos benefícios dos artigos 19, 19-A e 26 da Lei nº 11.196/05 (Lei do Bem) que permitem que as empresas deduzam para efeito de cálculo do lucro líquido, na determinação do lucro real e na base de cálculo da CSLL, os dispêndios com pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica (PD&I), para o ano calendário de 2016. O art. 4º dispôs que a suspensão dos incentivos valeria a partir de 1º de janeiro de 2016.
Ocorre que a referida Medida Provisória não foi convertida em Lei, tampouco foi editado Decreto Legislativo para tratar das relações jurídicas decorrentes.
Sendo assim, em relação aos efeitos de MP não convertida em lei, o §3º do art. 62 da Constituição da República (CR) estabelece que:
- “As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes”.
O mesmo artigo dispõe ainda, que não editado o decreto legislativo até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia da MP, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência serão por ela regidas. (§11 art. 62 da CR/88).
Com base nos pontos apresentados acima, como a MP nº 694/15 não foi votada e convertida em lei dentro do prazo legal e nem foi publicado decreto legislativo, essa situação gerou uma insegurança jurídica quanto à suspensão dos benefícios, para o período de 1º de janeiro a 8 de março de 2016, período em que a MP vigorou.
Neste cenário, não ficou claro para as empresas se as deduções dos dispêndios realizados com PD&I no período de 1º janeiro a 8 de março/16 podem ou não ser realizadas para efeitos de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL.
Para melhor compreensão do tema e solução desta questão, a seguir, alguns aspectos serão avaliados: (i) majoração de impostos via MP; (ii) princípios da anterioridade anual e nonagesimal; (iii) suspensão dos benefícios para o ano calendário, e; (iv) fato gerador do IRPJ e CSLL na apuração anual.
Quanto a majoração de impostos via MP, o § 2º do art 62, da CR/88 prevê:
- “Art. 62.
§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.
Considerando que a suspensão dos incentivos fiscais da Lei do Bem, via MP 694/2015, representa majoração do IRPJ a pagar para as empresas beneficiárias da Lei do Bem, a sua não conversão em lei até o último dia do ano de 2015 retira seu efeito para 2016.
Assim, no que tange a apuração do IRPJ, não há dúvidas quanto a utilização dos benefícios, sem ressalvas, para todo o ano de 2016. Quanto à CSLL, importante destacar que o § 2º do art. 62 não se aplica às contribuições, visto que esse menciona apenas os impostos.
Superado o aspecto da majoração de impostos via MP, argumento complementar que merecer ser avaliado, diz respeito aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal.
Em relação a aplicação destes princípios ao IRPJ e CSLL, dispõem a alínea “b”, do inciso III, art. 150 e o § 6º do art. 195 da CR/88:
- Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III – cobrar tributos:
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
Art. 195.
(…)
6º As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, “b”.
Em relação ao IRPJ, diante dos artigos acima, fica claro que este imposto deve atender ao princípio da anterioridade anual (art. 150, III, “b”), ou seja, caso a MP 694 tivesse sido convertida em lei em 2016, a cobrança tributos pela majoração do IRPJ (suspensão dos incentivos fiscais) não poderia gerar efeitos neste mesmo ano base.
Contudo, na avaliação da CSLL, é preciso maior atenção, visto que o §6º do art. 195 da CF/88, apresenta que as contribuições sociais só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado (princípio da anterioridade nonagesimal), não se lhes aplicando o princípio da anterioridade anual (art. 150, III, “b”).
Assim, considerando que os arts. 62, §2º e 150, III, “b” da CR/88, não se aplicam à CSLL, em interpretação inicial do §11 do art. 62 da CR/88, até poder-se-ia entender que, na ausência de edição do decreto legislativo disciplinador, iriam ser aplicadas as disposições da MP 694/15 para o período em que esteve vigente, ou seja, a suspensão para os meses de janeiro, fevereiro e março/16.
No entanto, é importante destacar que o texto da MP prevê a suspensão para o ano-calendário e não apenas para os meses de janeiro, fevereiro e março/16, não havendo previsão legal que justifique a suspensão de forma parcial. Assim, por esse aspecto interpretamos que tanto para o IRPJ, quanto para a CSLL, é possível a utilização dos incentivos fiscais para todo o ano calendário de 2016.
Reforçando o entendimento do parágrafo acima, outro aspecto que merece ser avaliado, diz respeito ao fato gerador do IRPJ e CSLL na apuração anual, que é em 31 de dezembro do ano calendário de análise. Assim, as empresas que apuram seus resultados de forma anual, embora não tenham utilizado os benefícios da exclusão adicional da Lei do Bem em suas estimativas mensais, poderão utilizar a dedução de forma acumulada, uma vez que o fato gerador tanto do IRPJ, quanto da CSLL é anual.
Conclusão
Diante dos aspectos de análise e bases legais apresentadas acima, entendemos que os benefícios dos artigos 19, 19-A e 26 da Lei nº 11.196/05 (Lei do Bem), podem ser utilizados pelas empresas, considerando os projetos de PD&I e dispêndios realizados para todo o ano calendário de 2016, incluindo, portanto, o período de 1 º de janeiro a 8 de março de 2016.
Cumpre-nos mencionar, no entanto, que trata-se de nossa interpretação dos dispositivos legais podendo as autoridades fiscais interpretarem de modo diverso ao aqui apresentado.
